Justiça pelo diálogo
Por: Ana Vitória Reis
Todos os dias mais de 250 pessoas chegam ao Núcleo Central da Defensoria Pública do Estado do Ceará . Antes do dia amanhecer, uma fila já está formada do lado de fora no prédio, no bairro Luciano Cavalcante, em Fortaleza. Muitas histórias se confundem, mas o objetivo é o mesmo: esperar por alguma solução que lhe traga justiça.
Foi numa segunda-feira, no comecinho da manhã, que encontrei com Maria*, uma das dezenas de pessoas que aguardavam para pegar a ficha. Ela estava ali para reclamar pela demora da decisão do Judiciário. São 11 anos aguardando para receber pensão alimentícia para sua filha. Situação que a revolta e a faz desabafar com emoção: “A justiça é lenta e fraca”.
É comum encontrarmos casos como o de Maria* pelos corredores da Defensoria. O órgão, criado pela Constituição de 1988, foi instalado no Ceará em 1997. Dentre as esferas de atuação da defensoria, o principal objetivo da instituição é a solução extrajudicial dos conflitos para os assistidos que não têm condições de pagar por um advogado.
No Ceará, os atendimentos são divididos em 12 núcleos, como Consumidor, Idoso, Saúde, Direitos Humanos, NUSOL - Núcleo de Solução Extrajudicial de Conflitos, Criminal, Moradia Família, Criança e Adolescente, Cível, Defesa da Mulher. Eles são distribuídos entre o Núcleo Central de Atendimento - NCA e em outros locais da capital escolhidos de forma estratégica, como explica Andrea Rebouças, Supervisora do NCA: “O serviço tem que ser acessível à todos. Essa descentralização é para garantir o acesso à justiça”. A defensoria contempla também os bairros Mucuripe, João XXIII e Tancredo Neves. “A gente atende todo e qualquer público”, completa.
O Núcleo Central é o que mais recebe demandas. O atendimento começa às 7 da manhã e segue até a última pessoa que fica na espera. Primeiro é entregue a ficha para triagem e em seguida, a específica de cada setor. “Cada caso tem sua especificidade, cada família traz um valor agregado e é isso que faz com que o nosso atendimento seja diferenciado”, relata Andrea.
Em meio aos conflitos, os defensores também trabalham para buscar a conciliação por meio da conversa. Um caminho que, apesar de parecer mais simples, mas envolve muita complexidade. “Se pensa que o amigável vai ser mais fácil porque na justiça demora mais, vai ser mais burocrático. Mas o dialogar também não é fácil”, afirma Rozanne Rodrigues, do NUSOL, Núcleo de Solução Extrajudicial de Conflitos.
O diálogo é um elemento importante no trabalho da defensoria. Nas salas de mediação, o uso de mesas redondas chama atenção. Elas são usadas para enfatizar que não existem lados opostos. “As vezes eu não consigo dialogar, as vezes eu não consigo me fazer entender, aí o defensor, entra o mediador, exatamente para tentar construir aquele diálogo que em algum momento ele foi rompido”, lembra Andrea. Em muitos casos, os defensores se utilizam do setor psicossocial para auxiliar no trato com os cidadãos que chegam fragilizados e precisam de um acompanhamento durante o processo.
Outro desafio da defensoria é dar um atendimento humanizado aos assistidos. “A gente tenta buscar uma melhor qualidade no serviço a cada dia, na agilidade, na eficiência do serviço público, sem esquecer o lado humano”, comenta Andrea. O acompanhamento que inicia na ficha da triagem, permanece até o fim do processo. Isso, entretanto, torna-se difícil diante da grande quantidade de demandas que chegam.
Para suprir esses atendimentos a defensoria conta com o apoio das universidades de direito da capital cearense. Por meio de convênios, os núcleos de práticas jurídicas das instituições, auxiliam no trabalho realizado pela organização. Como consequência, acabam contribuindo para o acesso à justiça. A agitação dos corredores não difere da realidade da defensoria. Os dias são repletos de surpresas e desafios numa missão que parece ser impossível. “Nós somos instrumentos de pacificação social”, enfatiza Andrea.